depoimentos

Zé Eduardo Nazário

O que mais lembro do Nico é o sorriso e a simpatia, além do grande respeito e amizade que sempre demonstrou comigo.

Conheci o Nico em São Paulo no final da década de 70, na época em que eu estava realizando trabalhos com Hermeto, Egberto e Grupo Um. Creio que o Nico estava retornando de um período de estudos nos Estados Unidos e o bairro de Pinheiros era um celeiro de músicos que estavam experimentando pela primeira vez, depois dos tempos mais obscuros da nossa história, um período de criatividade, com alguns espaços onde podíamos tocar mais a vontade.

Havia o Teatro Lira Paulistana, na rua Teodoro Sampaio e casas noturnas como o Penicilina, onde eu tive a oportunidade de tocar com o Nico inúmeras vezes, e sempre foi muito divertido, não só pela música, mas pelas boas risadas decorrentes dos nossos papos de fim de noite. Depois ele se mudou para o Rio, não tivemos mais tanto contato e a última vez que tocamos juntos foi no Curso Internacional de Verão de Brasilia em 1992, quando realizamos dois concertos maravilhosos na sala Martins Pena, superlotada e vibrante (foi recorde de bilheteria na época, com gente espalhada pelos corredores) e também tocamos numa casa noturna, ao lado de Nelson Faria, André Dequech e Nivaldo Ornellas, que também eram professores do curso naquele ano.

Havia com certeza uma empatia e uma grande facilidade em trabalhar com ele. Nesse mesmo evento em Brasilia me lembro que tivemos apenas um curto período de tempo para preparar o show. Cada um deu algumas idéias, apresentou algumas músicas e pronto, estava fechado, e ninguém poderia dizer ao ouvir a gente tocando que ficamos apenas umas treis horas para preparar o show todo. É claro que a experiência dos músicos conta muito nessa hora, e o Nico pegava as coisas com grande facilidade e resolvia tranquilamente. Seus solos eram particularmente criativos. Tinha um grande senso rítmico, melódico e harmônico, e também lia música muito bem, ou seja, um músico completo.

No aspecto pessoal, tem um caso que pode ser verdade ou ficção, mas de qualquer maneira é engraçado e tem a cara dele: numa sessão de gravação para um pessoal evangélico, os músicos (dentre eles o Nico), "quebraram tudo", e quando foram ouvir o resultado, houve um certo desconforto entre os pastores, que queriam algo, digamos, mais... vocês entendem o que quero dizer! Aí o Nico, que tinha gostado muito do resultado, e sentindo o clima, saiu com essa: "Tem algo de divino nessa música!", e conseguiu convencê-los a deixar como estava, vendendo o seu peixe de maneira singela, com sua aguçada clareza mental.

Fora as excelentes gravações com dezenas de artistas, onde sua contribuição vai além de uma simples performance profissional, pois ele colocava a alma em tudo que tocava, sua técnica e destreza com certeza angariaram uma legião de fãs e seguidores, que se sentiram estimulados a estudar com grande empenho para tentar chegar perto daquilo que ele fazia. Creio que num país como o Brasil, que tem um número bem menor de grandes contrabaixistas se comparados à Europa, Escandinávia e Estados Unidos, por exemplo (desculpem, mas é um fato), o Nico é uma luz para qualquer músico que deseja se aprimorar e tentar atingir um nível de classe mundial no contrabaixo, elétrico ou acústico.

Curriculum

Nascido em São Paulo em 1952, a música desde muito cedo ocupou espaço na rotina de Zé Eduardo Nazario, tendo sido o piano seu primeiro instrumento. Aos 10 anos iniciou seus estudos de bateria e percursão e, aos 12 anos ganhou uma bateria de seus pais e a partir de então iniciou intensa carreira profissional como
Baterista, percussionista, professor, compositor e produtor.

Ze EduardoEm quatro décadas de atividade profissional, tem atuado em todas as áreas da música: gravações, concertos, workshops, programas especiais para rádio e TV e aulas particulares no Brasil e exterior. Formou em 1976, ao lado do irmão Lelo, o Grupo Um, banda pioneira no cenário do jazz e do jazz-rock brasileiro, responsável pelo lançamento de Marcha Sobre a Cidade, o primeiro LP instrumental independente lançado no Brasil .

Alguns grupos dos quais participou são hoje referências mundiais, quando se fala de música instrumental brasileira, como os de Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Grupo Um e Pau Brasil, Em 1993, ao final de uma turnê pela Europa, o Pau Brasil que, com o CD "Babel", recebeu o prêmio Sharp de 1996 como "Melhor Grupo Instrumental", e tendo sido lançado no mercado norte americano em 1997, foi indicado ao Grammy na categoria "Best Jazz Performance". Trabalhou também ao lado de grandes nomes como Milton Nascimento, John McLaughlin e Joe Zawinul. Tem se apresentado, com seu próprio grupo, em formações que variam entre Trio, Quinteto e Octeto. Produziu e lançou os CDs ZEN (1999) e Percussônica (2000). (Jairo Lavia)

Em dezembro de 2005 Zé Eduardo Nazario recebeu, da Universidade Federal da Bahia, o reconhecimento do "Notório Saber", título concedido considerando sua vasta e rica trajetória profissional como músico.

Devido ao sucesso do cd "Encounterpoint", que figurou entre os "Top 20" mais tocados nas programações de jazz das rádios norte americanas por vários meses, tendo sido também escolhido como um dos 10 melhores cd's de jazz do ano de 2008 pelo jornal "Tribuna da Imprensa" do Rio de Janeiro, além de farto material escrito pelos principais criticos de jazz em atividade, Zé Eduardo foi novamente convidado a ir a Boston em junho de 2009, para gravar um novo trabalho com John Stein.

Atualmente Zé Eduardo Nazario divide seu tempo entre aulas particulares, workshops, shows, gravações e projetos criativos.